sexta-feira, 12 de março de 2010

------------------ A Saga Andaluza -------------------------

Parte I
(em tom épico)

Queridos! Que saudade de vocês!!! Espero que tudo esteja resplandecente com o ardente sol fronteiriço.... mas motejeis, meus amigos, porque sobre vocês não pairam os pecados concupicientes do Velho Mundo e tampouco os maus augúrios dos verdugos ancestrais!

Eis que aportei justamente no seio incólume da matreirice contemporânea! Ontem, por exigência das circunstâncias capitalistas vi-me impelida a consultar meus humildes proventos através do ente pseudo-real conhecido pela alcunha de WWW. Pois em meio à sondagem de minha modesta condição material, subitamente, o tal doblevêdoblevêdoblevê negou-me tal ensejo! E o fez de modo tão brusco e inumano que tampouco aceitou replicações de minha indignada pessoa.E o maior despautério de todos: roubou-me, por um momento, o direito civil de usufruir do sacro ato de levantar bens do caixa-eletrônico.

Visualizem o contexto, camaradas... um ser humano, pecador consciente, submetido às mais variadas tentações do consumismo exacerbado... sem dinheiro. Pois este ser desaventurado era
eu. Imaginem, caríssimos: sem beca, sem proventos, sem efígies e tampouco cartão de crédito. Eu era o reflexo perfeito da miséria!

Desdita maior, irmãos, é o ato covarde das grandes cadeias de grife, que, justamente neste momento de fragilidade, expõem seus finos artigos à exclusão. Valentino, Chanel, Vitor Hugo, Balenciaga, Fendi...tudo! Tudo ao alcance apenas dos desejos de uma humilde (e desprevenida)
consumidora. Ai de mim! Agora me restavam apenas as belas imagens da prosperidade de antanho, além das sublimes paisagens andaluzes (pelo menos isso!)... apenas isso, e nada mais...

Mas, dado tempo ao tempo, desvendei a ordinária desfaçatez do gênero humano! Não é que, no
mesmo dia de minhas desventuras em série, uma rede internacional de piratas on-line foi veementemente desmascarada? Sim! Oh, sim! Todos aqueles cruéis carniceiros, invejosos da pujança de outrem urdiram vilanias impensáveis com o capital alheio, deixando milhares (senão alguns milhões) de pobres consumistas como eu, à mercê da frieldade inorgânica da insolvência.

Malditos! Mil vezes malditos!

Mas como ao Universo lhe foi outorgado o revoluteio ao infinito, eis que o nobre Atlas auxiliou-me, fazendo com que nosso orbe girasse mais depressa... Milagrosamente a bravata foi
desmascarada, os culpados tiveram seu momento de vergonha midiática, e tudo voltou ao seu curso normal. Mas, o melhor de tudo, meus amigos, é que eu podia novamente! Mais uma vez estava empoderada monetariamente! Até o sol brilhou mais intensamente naquele momento, e eu notei que, no exato instante de minha descoberta, seu brilho tremeluziu sutilmente e eu ouvi... sim, sim, naquele instante inócuo, ouvi! Um suave ruído como de harpas e arranjos quase doces tocados em alaúdes afinados por vozes de querubins... e a eles mesclava-se um murmúrio como cântico de anjos entoando uma ode, na qual pude, claramente, distinguir a palavra... "liquidação". Minhas preces foram ouvidas, e fui abençoada pelo panteão de entidades que palmilha os céus!

Mal sabia eu que uma simples loja havia se transmutado numa selva repleta de animais sedentos por consumir...

(Continua...)

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